Não discutas com o teu homem, queres que te deixe?
Não digas que não gostas de alguém, parece mal.
Não, não, não...
Por onde fica a liberdade da palavra com tanta amarra imposta? Com tamanho foco no receio de falar, que será do maior som que essa liberdade criou para se sentir no mundo?
Sociedade hipócrita que assiste impávida a injustiças, cala-se conivente perante elas.
Ensina-nos a dizer o que os demais querem que digamos mesmo que desprovido de honestidade. A obrigar-nos ao anonimato para expressar o que nos vem na alma. A atirar a Verdade para que seja subjugada ás vaidades alheias.
A minha palavra é minha e não a deixo ser escravizada pela opinião doutrém que não eu. As palavras bonitas, os palavrões. Meus. As palavras doces e as cheias de raiva, aquelas que não trazem segundas intenções, honestas, cruas.
Se eu ganhava mais fechando a boca? Tantas vezes... Mas isso não era verdadeiro para mim e ainda que me arrependa depois, não vou ser algo manufacturado para prazer da plateia. Ser um fantoche não é meu dream job.
Palavras. São o que tenho, sentimentos expressados numa folha virtual. Pedaços de mim. Como renegá-los? Como afogá-los ou escondê-los? E porquê? Não! Com tudo o que isso acarreta.
Sinto-me a esmorecer neste circo de Inverno que montaste para nós, uma rosa a murchar sem que ninguém o note.
Deitada na cama a ver o dia fugir pelas frestas da janela mal aberta, é a minha vida que por ali se escapa?...
Eu gostava de ser feliz e contente com o sunâmbulismo das neves e gelos que me dás a comer, essa impávida e serena espreita dos dias e noites que se seguem uns aos outros. Desculpa-me mas não consigo.
Talvez seja eu. Sim, pode ser isso, pode ser algo em mim que me impede de ver o quão maravilhoso pode ser este modo de ver a vida, pode pois... Se ao menos assim fosse...
Quero cores, calor, sol, palavras. Não preciso de folia desenfreada, também gosto do silêncio.
Equilíbrio, é tudo quanto peço. Sai da tua zona confortável...
Estou cansada de me sentir cansada de dizer-te tantas vezes o mesmo, amor.
Estou a perder a cor e as folhas e as minhas pétalas pedem que as salves das intempérides e dos ventos gelados. Consegues?...
Havia, num dos meus livros de escola, há muitos anos atrás, um poema dedicado ao Outono do qual ainda recordo pedaços.
'tela pintada por não sei que pintor´, 'se é de morte ou de vida não sei', 'ei-lo, chegou o Outono'...
Era um dos meus poemas favoritos, se ao menos soubesse de quem!
Não gosto do São Martinho, castanhas nem vinho. Apraz-me o vento húmido a brincar com os meus cabelos, o cheiro.
O Outono trás cheiros que me invadem e inspiram, em tons de castanho amarelecido, folhas caídas calçada afora.
Quando criança, o Outono traduz-se em mudança, mais um ano estudantil, novos livros com cheiros diferentes, amigos que partem e amigos que chegam, uns de novo, outros são novos.
A vida renova-se quando as folhas morrem nos passeios e nos bancos de jardim, as árvores aguentam impavidamente as investidas do Inverno e daí a um tempo certo, outras folhas, a vida corre como planeado. A natureza segue o seu próprio relógio.
Do Outono, guardo o vento, o som dos meus passos, o cheiro e aquele poema que me levava da minha carteira de escola e me dava asas para voar céu adentro, e me inspirava a sonhar.
Dúvidas, incertezas... Que dias mais me esperam, nesta angústia que enlouquece e ensurdece até não mais?...
Para quando a hora de que todos falam, a do cair do pano fraudulento e das benesses de quem as espera em quase desespero?...
Haja dias de um azul que aqueça o coração, que o livre das más memórias e o transporte, sereno e confiante, para longe dos rumores e boatos, das injustiças e falsidades, espelhos da futilidade.
O breu que envolve o não saber, é de tal forma denso que se torna palpável, o seu cheiro entranha-se na pele, a sua penumbra nota-se no sombrolho franzido.
Por hora, resta aguardar impacientemente, para que venha o dia de todas as decisões.
Beijavas-me de forma quase desesperada, não fosse o nosso tempo na terra acabar. Lembrei-me, lembrei-me dos cheiros e do teu toque por mim acima e abaixo, lembrei-me.
Ah, o piso térreo onde me aninhei a ti e te olhei dormindo, qual menino nos meus braços. O teu fogo jovem e sorriso acanhado foram o epicentro do meu mundo por tantas noites em branco, que lhes perdi a conta. Amei-te com tal vontade e devoção, que não sei como não te odeio por me teres abandonado à minha sorte.
Será que te lembras, do mel das palavras que me dedicaste, ou esqueceste de tudo, agora que dás a mão a esse novo amor com que te passeias?...
A mão, essa mesma mão que encontrou a minha por entre o barulho e a multidão das vozes enebriadas. Essa mão na minha cara, no meu pescoço, por todo o meu corpo...
O teu beijo sôfrego e viciante, como nenhum que eu havia conhecido, não me esqueço... O beijo que me tremia as pernas e me esvaziava a mente adúltera, pecados e pecados sem vestígios de culpa.
Já não te vejo sorrir. Apenas conto as lágrimas que deixas cair entre soluços e sinto-as arder-me nos olhos. Queria fazer mais. Tirar-te essa dor e encher-te de esperança.
Amanhã brilhará o sol. E depois também. Um destes dias, o sol será teu novamente. Tens de acreditar, Ana. Por ti e por todos quanto te adoram ver sorrir.
Porquê? Por isso mesmo e porque a tua vida é demasiado preciosa para a passares a chorar.
Por entre a neblina duma manhã vazia, um sono que não se deu. Passos, tilintando no piso húmido, quase pedindo perdão pelo barulho causado. A sombra que anuncia o corpo cansado de um vagabundo da vida, um mensageiro de outrora.
Tráz novas. Serão? A derradeira notícia do que ficou para trás de nós. Recordação afogada e esquecida. Memória de um eléctrico da cor do sol. Da escuridão dos dias obrigados a engolir o pó das surras. Um cinto, uma voz, tantas vozes, nada a que queira voltar, cheiros que não sei identificar.
Vultos de nós. Todos os temos. Não nos deixemos guiar por eles.
Noite quente e sem voz, noite de lua que se esconde no terraço do prédio mais alto da urbe. Noite de solitária espera e recordação.
Recordo-me de ti e das palavras que as tuas mãos escreveram e de como me fizeram sentir, do cheiro que não senti, do toque de que me desprendi.
O amor em jeito de não-amor, a platónica necessidade de ti.
Foste um sonho que me aconteceu, levavas-me do centro do meu mundo rural e mostravas-me as maravilhas que as torres altas encobriam. Foste o horizonte do meu dia, palavras apenas. A noite trazia-te com um sorriso nos meus lábios. Que falta me fizeste! Quantas noites frias e sombrias passei eu, sem a luminosa presença de ti, sem a luz que fazias sair de mim própria.
Recordo-me de ti. Onde cái agora a tua voz? Por onde espalhas esse teu suave toque de carinho?
Amigos. Nunca os terei demais e nunca os poderei substituir.
Algo de belo e espinhoso, amor e revolta, muito amor para aguentar o tamanho que a revolta alcança.
Eu e tu. Flores raras e mortais, venenosas para si mesmas.
Digo tantas vezes que te amo que ás vezes me esqueço de me deixar levar simplesmente pelo que sinto, sem sentir necessidade de o racionalizar. Somos assim, simples e extremamente complexos. Humanos.
Não o desejaria de outra maneira... Nenhuma história grande se constrói facilmente.