À laia de desastre, no momento em que comemoro um aniversário, um pedaço de mim morre e desta vez, possivelmente para sempre.
É duro e vil, cruel mesmo, que a boca tenha vida própria e não obedeça a civismos nem reflecções. Mas a boca foi feita para falar, para beijar, não sabe ficar indiferente a posições de desamor.
E o peito chora, todo o mundo cái em cima dos meus costados e eu, engolida que sou neste buraco negro da alma, definho sem forças nem vontades, sem uma parte que é minha e me está a ser negada.
Concessões. Fazê-las, esperar que as façam. Querer as coisas mais simples do mundo e ver que não se dão.
O coração de uma mulher, seja ela quem for, quer vir em primeiro, numa prioridade quase infantil, quer devoção e companhia.
E quando não tem esse sustento que lhe dá vida, murcha em si.
Eras tu ou era eu, que nos afundava a história e não deixava que ela se fizesse contar? Já não sei, já não me lembro, tenho nuvens nos olhos, tenho pedras no peito.
Queria ter-te como nunca te tive, sentir-te como se não houvesse mundo à nossa espera, essa parafernália de cousas que temos para fazer, para desfazer, para agendar.
Sinto-me um compromisso sem hora, um apontamento esborratado no calendário expirado, sem floridos, sem emoções.
Se esta história não se perdura, não é por falta de Amor. Será por falta de quê, então?
Não quero mudar mais, dar mais, dei que chegue, mudei bastante, que mais podes pedir?
Tenho sangue quente nas veias, não me vou desculpar por tal.
Não, não está a resultar. Nenhum de nós tem o que precisa, o que quer. E no entanto, amamo-nos.
Sou humana, de carne fraca e imoral. Sou uma só e albergo milhares de mim, em mim.
Tenho as mãos cansadas e sem força, deixo-as cair em desespero. Não sei que mais fazer, sinto-me afogada e soterrada, não consigo agir de outro modo. Estou enredada num misto de sentires e cheiros e não estou a vislumbrar uma saída em grande estilo.
Quero fugir de mim, do reflexo do espelho quebrado, dos modos loucos de mim.
Despir a minha pele e deixá-la endurada no guarda-fatos de nogueira falsa.
Queria poder gritar que te amo mas não posso. Queria poder te abraçar e tocar e beijar à luz do dia, não devo. As pessoas olhariam para mim e diriam que sou louca. E sou. Sou louca por ti e por ser tua. Sou louca que nem uma adolescente apaixonada pela primeira vez. É isso, estou apaixonada. Mas não era suposto, não me era permitido, simplesmente não é. Ainda assim, grito a ti, no silêncio rouco das nossas horas, que te amo, que te adoro, que sonho contigo, que adormeço e acordo contigo no pensamento.
Se ao menos fosse verdade. Se ao menos fosse possível.
Tenho um choro guardado dentro de mim que é para ti. Tu, que não terias vindo para me magoar, provaste ser mais um motivo de dor na minha vida. A idade não desculpa, nada desculpa que me tentes e me largues sem mais não. Eu confiei em ti.
Sou estúpida e parva e grito e digo asneiras. Sou terna e amorosa e faço tudo quanto queres. Menos resignar-me e deixar cair a imensa falta de tacto com que me tacteias nuns dias. Sou tua e isso pôe-te num lugar confortável de onde não queres sair, nem que seja para fazeres valer o estatuto. És uma besta com um b muito maiúsculo e não me ligas patavina dias inteiros por saberes que ainda assim, estou lá, sou tua. E a culpa é minha por te deixar ser assim e te dar a segurança do meu regaço e do calor do meu amor que correu atrás do teu para o aninhar nele. A culpa é tua por seres assim e não te esmerares para mudar por mim e por nós e esperares que eu faça tudo e tudo se resolva por si só sem que tenhas que lutar por isso. Sim, sou estúpida e parva mas dou-te todo o meu amor e provo-to e mostro-to e tento falar contigo para se dar uma solução às coisas, às nossas coisas e tento e tento e tento outra vez. O quê que tu fazes? Aturares-me apenas, apesar de difícil não é suficiente, eu também te aturo e as bases de uma relação não se medem pela capacidade de aturar o outro. Sou tua, tão tua que mete nojo, o medo de te perder é palpável e tu sabe-lo, parece que te aproveitas disso vez em quando.
Durmo, o zumbido no meu ouvido estraga o que é de bom guardar, os cheiros e as flores que os sonhos negros engoliram. O céu é uma sombra sobre as árvores nuas. Vou adormecer com elas.
É tarde. A noite está cerrada e vestida de um luto que dói.
Quisera-te aqui a amenizar a crescente provação dos dias lentos e quentes. Este Inferno meu, sem ti.
É de oiro e prata este penar soluçante que se pendura na garganta fechada e seca de onde não saem poemas de amor.
Dói-me o peito e o ar falta-me, faltas tu e teu cheiro a suor que se entranha na carne, teu sorriso patético e sem vontade. Oh!, que angústia esta que me assola e dá de beber amargo trago sem pejo! Que miséria de espírito me assalta e me rende, me leva a melhor através do cansaço de te tentar ensinar a perceber a dor que causas. Todo o corpo me dói e se verga à vontade do sofrer molhado das faces ruborizadas.
Eu não sou mais eu. Sem ti eu sou nada, contigo nem sei. Não sou eu de maneira alguma, deixei-me enredar em ti e nos teus modos grosseiros e já me esqueci de ser eu.
Não me conheces. Achas que sim mas enganas-te. Não, não é possível que me conheças. Eu não me conheço.
Sou uma mancha branca que se move e respira em silêncio, sou pouco mais que a sombra que largas em qualquer lugar, sou a loucura de viver para amar.